Harry Potter inspira aulas de português e química no sertão pernambucano
Professoras se inspiram na saga de Harry Potter para trazer conteúdos da grade curricular do Novo Ensino Médio à sala de aula
Trazer o cenário mágico da literatura para a sala de aula, a fim de torná-la um espaço mais interativo e lúdico, unindo as disciplinas de língua portuguesa, que eu ministro, e química, da professora Morgiana Sena. Assim nasceu o projeto “Escola é magia”, da EREM (Escola de Referência em Ensino Médio) Fernando Bezerra, localizada na cidade de Ouricuri, no sertão pernambucano.
Sabemos que a verdadeira mágica está em aprender. Escolhemos a série “Harry Potter”, da autora britânica J. K. Rowling, para ser a narrativa usada em aulas diferenciadas. A ideia era trazer conteúdos da grade curricular do Novo Ensino Médio envoltos na narrativa mágica e nos diferentes elementos dos livros.
Dividimos as turmas do 3º ano (aproximadamente 70 alunos) em quatro grupos, as quatro casas da Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts: Corvinal, Grifinória, Lufa-Lufa e Sonserina.
Para que todos soubessem o mínimo sobre a história, assistimos juntos o primeiro filme da série, “Harry Potter e a pedra filosofal”.
A partir daí, semanal ou quinzenalmente, eu e Morgiana passamos a ofertar atividades referentes ao projeto e suas disciplinas, separadamente em cada sala ou juntando todos os alunos em atividades que envolviam toda a escola. Fizemos aula de poções envolvendo o conteúdo de química, Torneio Tribruxo de Soletração, caça às Horcrux (realizada como uma caça ao tesouro com enigmas, QR codes e mensagens cifradas que levavam a diversos ambientes da escola, o que mobilizou toda a equipe), mini gincanas em sala envolvendo o conteúdo de língua portuguesa ou química.
Organizamos uma série de atividades que chamaram a atenção das outras turmas por ter uma narrativa diferenciada: íamos para a sala com capas e varinhas mágicas similares às usadas nos filmes. Nós as confeccionamos e vestíamos sempre que íamos fazer algo do projeto, diferenciando as aulas das “normais”.
Confira o site com detalhes das atividades do projeto
Algumas habilidades foram trabalhadas durante o ano, não só os conteúdos do currículo:
- Estimular a participação ativa e o desenvolvimento de habilidades de socialização, bem como o trabalho em equipe: as atividades eram realizadas visando o grupo (casas de Hogwarts) e as individuais avaliadas pelos cartões do banco Gringotes (Gringotscard). Assim, os estudantes tinham que participar em busca da pontuação geral das casas (os integrantes da equipe incentivavam a participação uns dos outros, pois todos eram beneficiados) ou procurar por benefícios individuais.
- Despertar o interesse pela leitura: durante o projeto, usei trechos dos livros em atividades de interpretação, incentivando a leitura integral da coleção. Muitos estudantes começaram a ler livros de Harry Potter, físicos ou no celular, o que também abriu as portas para outros títulos.
- Fomentar o trabalho interdisciplinar: durante o intercâmbio das aulas de português e química, eu e a professora Morgiana planejávamos as atividades do projeto, contemplando a mistura das disciplinas em aulas com jogos, intercalando conhecimentos, trabalhando ortografia, acentuação, ligações químicas na aula de poções… interligados os conteúdos por meio de um panorama mágico.
- Compartilhar conhecimento, ser solidário ao outro, cooperar com o crescimento coletivo, ampliar o aprendizado e desenvolver a pluralidade em um ambiente saudável de convívio: apesar do caráter competitivo, as atividades também fomentavam a ajuda mútua, pois todos os integrantes da casa tinham que ter conhecimento dos conteúdos para que a equipe fosse bem sucedida nos jogos de conhecimento. Assim, eles compartilhavam informações e ajudavam os integrantes com mais dificuldade nas atividades.
Outro marco do projeto foi a avaliação. Todos os estudantes receberam cartões de crédito personalizados com nome e casa à qual pertenciam, e iam acumulando selos que podiam ser trocados por vantagens no dia da avaliação, como poder deixar uma questão em branco e mesmo assim receber os pontos ou poder pesquisar durante 5 minutos no seu material.
O projeto propôs aos alunos, assim como às professoras, a apropriação de recursos tecnológicos disponíveis para a aprendizagem. Para isso, foram usados nas atividades QR codes, sites para inversão de textos e criação de enigmas, sites de criação de sites, para que os próprios estudantes aprendessem a criar os seus próprios, uso das redes sociais, entre outros. As principais ferramentas usadas foram: Google (slides, docs, sites e drive), Invertexto.com, Canva e Wordwall (para criação de quizzes).
O projeto ganhou destaque na escola e todos os envolvidos participaram ativamente. Até mesmo os estudantes das outras turmas se sentiam ansiosos para chegar ao 3º ano e fazer parte da iniciativa. Mesmo em um curto período (as atividades foram realizadas durante três bimestres, finalizadas com um jantar e a entrega de premiações às equipes vencedoras de cada sala) a iniciativa marcou o ano – e a vida dos estudantes.
O que é preciso para replicar o projeto?
Gostar da série, ter conhecimento do enredo e usar a criatividade. A história é bastante conhecida, então é muito provável que os alunos comprem a ideia com facilidade. Cabe ao professor buscar maneiras de inserir seu conteúdo na narrativa mágica da história: eu busquei os elementos que caberiam em uma aula de português e Morgiana buscou os elementos mais compatíveis com as aulas de química.
Além dessa pesquisa, acrescentamos tecnologia, buscamos sites (citados no texto) que oferecessem essa “magia” para as aulas, mas muitas de nossas atividades só precisavam de papel, alguns objetos (no caso de Morgiana, elementos químicos para realizar as poções e etc.).
O principal material pedagógico é a criatividade. Existem livros e muitos trabalhos sobre esse tema que podem ser um ponto de partida para a execução, há muita coisa, principalmente fora do Brasil, que pode ser adaptada à realidade de qualquer escola. Qualquer professor pode fazer a magia acontecer.
Adna Mirian Rodrigues Silva - Formada em letras pela Faculdade de Formação de Professores de Araripina, especialista em língua portuguesa e literatura brasileira pela UPE (Universidade de Pernambuco). Administradora do Instagram @professoriterativo
Fonte: Portal Porvir - Adna Mirian Rodrigues Silva